Artigo: Abril/ 2020

Dispensas em contratos públicos e a pandemia de COVID-19

Em: Direito Público

INTRODUÇÃO

 

A pandemia do vírus COVID-19, decretada em março de 2020 pela OMS (Organização Mundial de Saúde) é circunstância incontornável aos governantes do mundo todo, o que impõem às Administrações a adoção de condutas assertivas para pesquisa, contenção e combate da doença.

 

Tal circunstância fatalmente direciona o poder público ao progressivo gasto público para além das metas fiscais, em especial por meio de contratações diretas. Imprescindível, todavia, que no nível regional haja o reconhecimento do estado de calamidade pública. A medida, que depende de previsão legal e ato da autoridade do executivo, permite que o poder público aja com celeridade no controle de circulação de pessoas e também quanto aos investimentos sanitários e científicos pertinentes.

 

No âmbito nacional, foi editada em Fevereiro de 2020 a Lei n. 13.979/20, posteriormente alterada pela MP 926, de 2020, que procurou fixar os métodos da fase do planejamento das contratações públicas, com vistas a enfrentar as circunstâncias excepcionais decorrentes do novo coronavírus.

 

DISTINÇÃO ENTRE AS DISPENSAS DE LICITAÇÃO DA LEI 8.666/93 E DA LEI 13.979/20

 

A norma tem como fato a ser regulado uma situação de evidente excepcionalidade. Razão pela qual a regra das contratações e da mesma forma as exceções utilizadas no período de normalidade não podem mais ser aplicadas. Assim, é preciso se pautar pela razoabilidade e proporcionalidade das circunstâncias, sob pena de se adicionar uma etapa burocrática em momento que requer desburocratização.

 

Em outras palavras, a regra de licitação em aquisições pelo poder público, excepcionada nas dispensas e inexigibilidades, passam a ter novo contorno de aplicabilidade. Veja-se que os casos de urgência que normalmente autorizam dispensas de licitação, agora devem passar pelo crivo da finalidade, isto é, se relacionadas ou não ao combate da pandemia de Covid-19.

 

Exatamente por isso é que não devem os órgãos de controle ou até mesmo a própria administração transportar todo o procedimento para dispensa de licitação para os casos da nova lei, como a verificação de existência de ata de registro de preço em vigor ou ainda a necessária abertura de processo licitatório para suplantar o fim do contrato emergencial. A situação é de urgência e emergência, e a hipótese legal criou contratação direta específica e limitada no tempo, qual seja a duração do estado de calamidade pública.

 

Portanto as contratações diretas a serem entabuladas no âmbito da Lei n. 13.979/2020 não se confundem em absoluto com as contratações emergenciais típicas, seja pelo procedimento diferenciado tratado pela norma, seja pela aplicação direcionada e temporária.

 

Decorre disso a Administração estar impedida de contratar por dispensa de licitação, serviços, obras ou efetuar compras que não tenham destinação imediata às ações necessárias ao combate da pandemia. O desvirtuamento da hipótese legal enseja não só a responsabilidade por improbidade administrativa, mas também criminal. A distinção que se quer fazer é entre o artigo 24, inciso IV da Lei 8.666/93 (Lei de Licitações) e a hipótese do artigo 4o da Lei 13.979/20, alterada pela edição da Medida Provisória no 929/20 pelo Presidente da República. Este prevê que a “licitação é dispensável para aquisição de bens, serviços, inclusive de engenharia, e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus de que trata esta Lei”.

 

Evidente que, em qualquer dos casos de dispensa, seja nas hipóteses de normalidade seja nas hipóteses de enfrentamento da pandemia, há uma base comum de procedimentos necessários à contratação direta, a qual jamais deve ser descartada sob a alegação de excepcionalidade. Isto é, pautado pelo princípio da isonomia, deve-se instaurar procedimento administrativo de dispensa de licitação, no qual se fará a busca pelo maior número de prestadores de serviços com efetiva pesquisa de preços.  Nesse sentido, é importante destacar a responsabilidade das empresas chamadas a contratarem com o Poder Público em tais condições. Cumpre a elas verificar e exigir da Administração regularidade no processo administrativo de compra de bens ou prestação de serviço, haja vista poderem responder pela contratação.

 

Assim, é evidente que a mera indicação da hipótese de dispensa não é veículo mágico para o reconhecimento da legalidade do ato, ou seja, deve-se apor e demonstrar no processo administrativo a justificação da necessidade urgente e economicidade.

 

CONCLUSÃO

 

Portanto, a dispensa de licitação disciplinada pela Lei n. 13.979/20 se trata de uma nova hipótese, que é específica em relação ao gênero direta, porque detém finalidade estritamente identificada, qual seja o enfrentamento da situação decorrente das ameaças e danos gerados pela pandemia do COVID-19. Além do rito excepcional da dispensa de licitação, esta hipótese tem limitação temporal, pois somente tem hipótese de incidência no intervalo de tempo em que haja calamidade pública decretada.

 

O fato, porém, de não se circunscrever a dispensa para combate à pandemia nos mesmos requisitos legais e jurisprudenciais relativos à dispensa prevista na Lei Geral de Licitações, não confere ao Administrador Público discricionariedade absoluta para entabular contratos sob o guarda chuva da crise sanitária. Isto porque, toda e qualquer contratação feita com respaldo nos mencionados dispositivos legais deve ter estrita relação com a pandemia vivenciada, conforme se extrai da lei e, ainda que não vinculada a um processo licitatório subsequente ou a vinculação a uma ata de registro de preço, estão mantidas a necessidade de pesquisa de preço, demonstrada em um processo administrativo regular, no qual é fundamentada a vantajosidade daquela contratação e pormenorizada a necessidade e urgência do caso concreto.

 


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