Em: Direito Público
Assunto[1]: Para Sexta Turma do TRF3, remédio é imprescindível à preservação da vida da paciente, cujo direito está assegurado pela Constituição Federal.
Em recente decisão, a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região confirmou o direito de uma paciente, sem condições financeiras, de receber gratuitamente medicamentos não fornecidos pela rede pública de saúde, indispensáveis ao tratamento de osteoporose.
Em primeira instância, o pedido já havia sido julgado procedente, ratificando a tutela antecipada e condenando a União e o estado de São Paulo ao fornecimento dos medicamentos pleiteados até a convalescença da enfermidade.
Contudo, o estado de São Paulo recorreu, argumentando “ausência de interesse de agir”, sob a alegação de que bastaria o “comparecimento da autora ao Departamento de Assistência Farmacêutica para que fosse orientada quanto aos procedimentos necessários à retirada dos medicamentos”.
Ademais, defendeu que não cabe ao Poder Judiciário interferir na atividade da “administração da coisa pública.”
Do mesmo modo, a União também ingressou com recurso alegando ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda, posto que, segundo seu entendimento, seriam dos estados e municípios a responsabilidade pela aquisição de tais medicamentos.
Inobstante as alegações das recorrentes, o relator do processo, o MM. Juiz Federal Paulo Sarno, afastou a preliminar de ilegitimidade passiva, negando provimento aos recursos interpostos sob o entendimento de que deve prevalecer a necessidade de prover a paciente com medicamento essencial à preservação de sua vida, senão vejamos:
“O funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que, qualquer uma dessas entidades têm legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de ação que visa a garantia do acesso a medicamentos para pessoas que não possuem recursos financeiros”.
Na mesma esteira, manifestou-se no sentido de improcedência da tese arguida pelo estado de São Paulo acerca do “comparecimento em determinado Departamento de Assistência Farmacêutica para que fosse orientada quanto aos procedimentos necessários à retirada dos medicamentos”, vez que tal instrução só fora dada após deferimento do pedido de tutela antecipada.
A decisão em tela esteve assim fundamentada, verbis:
“No presente caso, restaram comprovadas, além da insuficiência de recursos da requerente, a essencialidade dos medicamentos pleiteados e ser a autora portadora de osteoporose com múltiplas fraturas na coluna vertebral, conforme atestado em receituário e formulário apresentados pelo médico.
[...]..
a recusa no fornecimento do medicamento pretendido pelo apelado implica desrespeito às normas que lhe garantem o direito à saúde e, acima de tudo, o direito à vida, direitos estes indissociáveis, razão pela qual se mostra como intolerável omissão, mormente em um Estado Democrático de Direito”.[g.n.].
Destarte, o Poder Judiciário, em acertada decisão, asseverou o cumprimento de um direito fundamental, vale dizer, do direito à vida, já que a mantença da saúde do cidadão é natural pressuposto para se alcançar, ultima ratio, a preservação biológica do ente humano.
À título informativo, colacionamos aqui o teor da ementa pertinente à Apelação/ Remessa Necessária 0002328-49.2007.4.03.6106/SP, a qual entendemos ser exemplo da mais pura tradução da justiça, verbis:
“CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.. AGRAVO RETIDO. REITERAÇÃO. INOCORRÊNCIA. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS. FOSAMAX 70 E MAXICALC D400. AUTORA DESPROVIDA DE CONDIÇÕES FINANCEIRAS. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO, ESTADOS E MUNICÍPIOS. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO ÂMBITO DO STJ. ESSENCIALIDADE DOS MEDICAMENTOS PLEITEADOS. DIREITO À SAÚDE INDISSOCIÁVEL DO DIREITO À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DEVER DO ESTADO.
1. Não conhecido o agravo retido interposto, uma vez que a parte deixou de reiterá-lo expressamente nas razões ou na resposta de apelação, conforme disposição do art. 523, § 1º, do antigo CPC, vigente à época.
2. Há de se enfocar os presentes recursos sob o ângulo da necessidade de prover o apelado com medicamento imprescindível à preservação de sua vida, cujo direito está assegurado, como inalienável, logo no caput, do art. 5º da Constituição. Portanto, como direito a ser primeiramente garantido pelo Estado brasileiro, isto é, pela República Federativa do Brasil, tal como se define o estatuto político-jurídico desta Nação.
3. Sendo o Estado brasileiro o titular da obrigação de promover os meios assecuratórios da vida e da saúde de seus súditos, e constituindo-se este pelo conjunto das pessoas políticas, quais sejam, União, Estados, Municípios e Distrito Federal, emerge o entendimento de que todas essas pessoas de direito público interno são responsáveis, nos termos da Constituição, pela vida e pela saúde dos brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil, mormente no que tange ao seu financiamento, tendo todas legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de ação que visa à garantia do acesso a medicamentos para pessoas que não possuem recursos financeiros.
4. Restando comprovadas a insuficiência de recursos da requerente, bem como a essencialidade do medicamento pleiteado, a recusa no fornecimento do medicamento pretendido pelo apelado implica desrespeito às normas que lhe garantem o direito à saúde e, acima de tudo, à vida, razão pela qual se mostra como intolerável omissão, mormente em um Estado Democrático de Direito.
5. Viável a imposição de multa diária à Administração Pública, que somente deverá ser aplicada na hipótese em que restar comprovado o retardamento injustificado no cumprimento da decisão judicial, não se mostrando excessivo o valor fixado no importe de R$ 1.000,00, eis que amparado nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
6. Agravo retido não conhecido. Apelações e remessa oficial improvidas.”
Por:
RICARDO SARDELLA DE CARVALHO
MARCOS ANTONIO GABAN MONTEIRO
[1] Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região – TRF3. Disponível em:< http://web.trf3.jus.br/acordaos/Acordao/Buscar
DocumentoGedpro/5754499>. Acesso em 10 de março de 2017.